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quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

CELSO FURTADO: QUE RUMO TOMAR?

CELSO FURTADO: "QUE RUMO TOMAR?"

NEUZA MACHADO


Para os leitores deste meu blog que se interessarem em compreender as sábias reflexões de Celso Furtado, editadas em 1991 (Atenção: leiam o capítulo sempre se conscientizando de que o livro de Celso Furtado foi editado pela primeira vez em 1991), publico aqui o capítulo inicial do livro Os Ares do Mundo, denominado “Que rumo tomar?”, pedindo-lhes que, a partir da leitura consciente que fizerem, possam refletir sobre os atuais acontecimentos sócio-políticos que incomodam a maior parte dos brasileiros, os quais já possuem conhecimento do que aconteceu no passado e o que agora acontece no Brasil.


QUE RUMO TOMAR?

Celso Furtado

Haviam decorrido quinze anos desde que em 1949 se iniciara a experiência da CEPAL, caso único de escola de pensamento surgida em terras latino-americanas. Santiago se transformara, desde então, em importante centro de atividade intelectual, especialmente no campo dos estudos sociais aplicados. Além da própria CEPAL e seu adjunto Instituto Latino-Americano de Planejamento Econômico e Social (ILPES), estavam presentes nessa cidade um aguerrido grupo de pensadores jesuítas e um não menos ativo núcleo de economistas neoliberais que se tornariam conhecidos como os Chicago-boys. Prevalecia em todos esses grupos, que competiam no plano doutrinário, o sentimento de que o que viesse a ocorrer na América Latina dependeria de alguma forma do que ali se discutia.

Quiçá ninguém tivesse dos acontecimentos em curso uma visão tão lúcida como o sociólogo espanhol José Medina Echevarría, meu velho companheiro dos primórdios da CEPAL, quando ainda tínhamos perto de nós essa outra guinada da História que foi a Guerra Civil Espanhola. Para José Medina, o que estava ocorrendo em Cuba teria profundas consequências na América Latina, pois estava conduzindo a uma radicalização de esquerda e de direita que seria de efeitos nefastos.

A nenhum de nós escapara que se produzira um tournant na América Latina a partir do incidente dos mísseis soviéticos instalados a poucos quilômetros da Flórida, do fracasso do projeto de Kennedy da Aliança para o Progresso e da consolidação da Revolução Cubana.

O Chile se constituíra em polo de atração da primeira vaga da diáspora brasileira após o golpe militar de 1964. Muitos brasileiros se haviam refugiado em embaixadas ou haviam cruzado a fronteira do Uruguai sem documentos, e agora começavam a afluir a Santiago. A referência principal na cidade era o poeta Thiago de Melo, que ocupava o cargo de assessor cultural na Embaixada do Brasil e habitava uma bela mansão de propriedade de Pablo Neruda, situada na encosta do morro de São Cristóvão, bem no centro da cidade. Thiago dedicava todo o seu tempo a receber refugiados brasileiros e a pô-los em contacto com personalidades chilenas que pudessem ser-lhes de alguma utilidade. Ele gozava de extraordinário prestígio no mundo cultural chileno e suas múltiplas relações foram de grande valia para muitos dos que aportavam sem maiores conexões locais. Essa situação ambígua não se prolongou por muito tempo, mas, enquanto durou, Thiago colocou os meios de que dispunha a serviço dos compatriotas que chegavam fugindo do terror instalado no Brasil, onde presos políticos já se contavam por milhares.

Neruda participava ocasionalmente dos encontros dos refugiados brasileiros na mansão do morro de São Cristóvão. Ele parecia estar sempre em posição de defesa, guardando-se contra toda improvisação como se em nenhum momento desencarnasse do papel de membro da direção do PC chileno. Para mim, ele fora sempre uma esfinge. Perguntava-me como era possível que o poeta da “Canção Desesperada” se extasiasse diante dos efeitos do carrasco Vichinsky. Sua alma parecia-me dotada de compartimentos estanques. De um lado da parede de vidro, situava-se o cantor das alturas de Machu Picchu e das Odes Elementares; do outro, o versejador partidário, desprovido de espírito crítico. Alguém perguntou-me em certo momento o que eu pretendia fazer com as medalhas condecorativas de que vinha de ser destituído pelo governo militar brasileiro. Respondi que iria pô-las no lixo, com exceção das que ganhara como membro da Força Expedicionária Brasileira. Neruda mostrou-se surpreso e aconselhou-me a ser paciente e a dar tempo aos militares para que voltassem à razão.

Darcy Ribeiro, que se fixara em Montevidéu, passou por Santiago em direção à Europa. Era dos que consideravam que os militares do Brasil não tinham base de sustentação na sociedade e, por isso, não se manteriam no poder por mais de seis meses. Em reunião na casa de Thiago, trocamos impressões sobre o assunto, alguns aproveitando a deixa para dizer o que esperavam do futuro. Samuel Wainer era dos que contavam reassumir posições de luta no Brasil a curto prazo. Foram muitos os que ficaram perplexos quando eu disse supor que meu exílio seria longo, e que estava fazendo planos para viver no estrangeiro em torno de quinze anos. Diante da incredulidade geral, expliquei-me: “esse golpe não foi improvisado. Por trás dele estão dez anos de conspiração. Começou quando acurralaram Getúlio e o levaram ao suicídio. No Brasil, todo processo de mudança político-social é lento. Se os golpistas, que dispunham de amplos meios de ação, inclusive ajuda externa, necessitaram de dez anos para tomar o poder, como imaginar que em prazo menor reverteremos a situação? Não digo que nada há a fazer. Cabe a cada um de nós”, adiantava eu, “fazer o melhor que possa no seu setor, mas não vejo possibilidade de que a situação se reverta senão a longo prazo. O que importa é que aqueles dentre nós que, em dez anos ou vinte anos, regressem não cometam uma vez mais os erros que facilitaram o trabalho dos golpistas”.

Tivera uma conversa dessa natureza no Rio, quando me despedi de alguns companheiros de trabalho que estavam indecisos sobre o rumo a tomar. “Sempre que possível”, dissera eu, “devemos resistir nos lugares que ocupamos, pois o golpe não foi improvisado e a reversão tomará tempo.” Lembro-me de que Nailton Santos, que dirigira o setor de Recursos Humanos da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE), entrou em profunda tristeza quando me ouviu. Ele estava com prisão decretada e não lhe restava senão evitar o pior, saindo do país. “Se o que você diz é verdade – arguiu – temos de reconhecer a falência de nossa geração.” De alguma forma, eu partia do pressuposto dessa falência. Tinha dúvida, apenas, sobre a profundidade do dano que faria ao Brasil uma ditadura militar que se prolongasse por um decênio ou mais.

Todos percebíamos que algo de “novo” estava ocorrendo no Brasil. Era evidente que as motivações dos que se haviam apossado do poder nada tinha a ver com o idealismo raso e inconsistente dos “tenentes”, que haviam vacilado entre a direita e a esquerda. Estávamos agora diante de um projeto “modernizador”, que partia da ideia de que, tanto a distribuição equitativa da renda como a convivência democrática, somente são alcançadas nas fases superiores do desenvolvimento. Assim, havia antes que conhecer as dores do parto da “acumulação primitiva”. Para essa gente, o desenvolvimento é um processo de domesticação da sociedade, requer o exercício de um poder autoritário. Enfim, era a vitória da doutrina da modernização tutelada. As pessoas que pensam assim são alérgicas ao debate aberto; sem que o percebam pensam em revólver quando ouvem falar de intelectual.

Nossos debates, agora, se realizavam de preferência no edifício da Comissão Econômica para a América Latina (CEPAL), onde eu trabalhava na preparação de um seminário sobre os primórdios dessa instituição. Com frequência saíamos para perambular pelas margens do rio Mapocho. Havia sempre novos participantes em nossas reuniões. Alguns vinham para respirar, sufocados pelo clima de repressão criado no Brasil, mas logo se impacientavam e preparavam o regresso. Outros haviam escapado à perseguição e exploravam a possibilidade de encontrar um abrigo. Em verdade, a quase totalidade partia do princípio de que “a coisa em breve melhorará”, viabilizando o regresso. Fernando Henrique Cardoso insistia em que era necessário encontrar ou abrir espaço para a luta dentro do Brasil. Alguma forma de intelligentsia independente teria de sobreviver, se desejávamos evitar que o obscurantismo aprofundasse as suas raízes. Não nos escapava que os novos donos do poder tudo fariam para cooptar essa intelligentsia, dificultando o mais possível a sobrevivência dos renitentes. A tentativa de Fernando Henrique Cardoso de voltar à universidade, de onde seria finalmente expelido, e a posterior criação do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (CEBRAP) inscrevem-se nessa linha. Eu não desaprovava, mas sentia que não seria este o meu caminho. Minha opinião era que deveríamos instalar no exterior antenas captadoras e transmissoras, a fim de alimentar de ideias as redes de trabalho intelectual independente que lograssem sobreviver no país. Lembrava-me dos versos de Juan Ramón Jimenez, coração, cabeça, nos ares do mundo.

Sentia-me que mais uma vez viria a prevalecer em mim a vontade de andar sozinho, de vagabundar como um lobo solitário. Respeitava aqueles que se organizavam para sobreviver e pensar com independência no Brasil. Mas também sabia o importante que era observar de perto o que se passava no vasto mundo, sem o que tenderíamos a cair no isolamento e a correr o risco de ficar prisioneiros de uma visão exterior concebida para reforçar nossa dependência. Era necessário acompanhar de perto o que se passava nos Estados Unidos, em cujo campo gravitacional estávamos inseridos. Isso sem desconhecer que também era necessário manter contactos em várias áreas da América Latina e, no possível, instituir mecanismos de ajuda mútua.

(Conf.: FURTADO, Celso. Os Ares do Mundo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1991: 19 - 23)

terça-feira, 3 de janeiro de 2012

CELSO FURTADO: INTRODUÇÃO AO LIVRO OS ARES DO MUNDO

CELSO FURTADO: INTRODUÇÃO AO LIVRO OS ARES DO MUNDO

NEUZA MACHADO



O texto de Celso Furtado, destacado como Introdução ao seu livro Os Ares do Mundo, foi escrito em dezembro de 1990. Já se passaram vinte anos, a partir da primeira edição, e os pensamentos do autor ainda vêm a propósito. 

Neste momento em que iniciamos o ano de 2012 como testemunhas de um escândalo político que afeta as bases da direita brasileira, mas não deixando esse dito escândalo de respingar também gotículas vergonhosas em alguns politiqueiros da chamada esquerda brasileira (o escândalo que se denominou em 2011 “Privataria Tucana”), percebo que seria de muita utilidade aos jovens estudiosos da História do Brasil, dos anos sessenta para cá, um envolvimento reflexivo com os pensamentos de Celso Furtado sobre os problemas que se cristalizaram no Brasil da ditadura e da pós-ditadura. Tais problemas, decorrentes da submissão de nossos políticos, militares, historiadores e pensadores, foram denominados com muita precisão (pelo mesmo Celso Furtado) de “colonialismo mental”, um fatídico colonialismo que, aqui, no vasto território brasileiro, infelizmente, ainda hoje, está difícil de ser extirpado das salas de aula das Escolas iniciais e secundárias e, principalmente, das Instituições de Ensino Superior .

Na impossibilidade de apresentar-lhes o todo do conteúdo do livro, transcrevo neste meu blog apenas a Introdução, com a plena certeza de que os que lerem este instigante texto buscarão adquirir o referido livro de Celso Furtado (seja novo ou já manuseado), para que possam entender, os jovens de hoje, mais um pouquinho da grave e problemática politicagem subalterna que ainda persiste no Brasil. Infelizmente, tal politicagem persiste, mesmo com a sociedade brasileira constatando gradativamente o grande avanço sócio-econômico dos anos finais do Governo do Presidente Luís Inácio Lula da Silva e agora culminando satisfatoriamente pelas mãos firmes da Presidenta Dilma Vanna Rousseff (administração econômica bem sucedida e jamais imaginada nos governos de direita que os antecederam).

Para os leitores deste meu blog que se interessarem em compreender as sábias reflexões de Celso Furtado, editadas em 1991, publico aqui a Introdução do livro Os Ares do Mundo, pedindo-lhes que, a partir da leitura consciente que fizerem, possam refletir sobre os atuais acontecimentos sócio-políticos que incomodam a maior parte dos brasileiros, os quais já possuem conhecimento do que aconteceu no passado e o que agora acontece no Brasil.


INTRODUÇÃO

Celso Furtado

(Conferir: FURTADO, Celso. Os Ares do Mundo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1991: 13 - 16)

Na linha de minhas duas Fantasias [livros de Celso Furtado], o presente volume reúne textos que se relacionam com experiências pessoais e reproduzem reflexões sobre a problemática desenvolvimento-subdesenvolvimento, a cujo estudo dediquei o essencial de minha atividade intelectual. Textos há que se situam em sua integralidade em um ou outro desses dois polos, mas a intenção predominante foi abarcar sempre as duas vertentes.

A parte I se refere ao período que se seguiu ao golpe de Estado de 1964. A saída para o Chile deu-me oportunidade de retomar de imediato a atividade intelectual no âmbito da América Latina. Mas minha experiência recente no Brasil convencera-me de que o de que mais necessitávamos era uma melhor compreensão das transformações que estavam ocorrendo nos Estados Unidos, dado que esse país assumira na plenitude o papel de centro mundial do poder. A força gravitacional que exerce esse centro sobre os países latino-americanos crescera tanto, que se tornara impraticável captar o sentido do que nestes ocorria se não dispuséssemos de hipóteses com respeito ao comportamento do sistema de poder norte-americano. Este ganhara tal complexidade – suas ramificações abrangiam muito mais do que as instituições políticas – que de quase nenhum alcance para compreende-lo eram os conhecimentos tradicionais de teoria do Estado. As velhas ideias sobre imperialismo, fundadas nas rivalidades entre Estados nacionais manipulados por interesses econômicos, eram de pouca valia para entender a ação transnacional das grandes empresas que entrelaçam os circuitos econômicos e financeiros nacionais. Daí que a Parte II seja uma incursão no vasto processo histórico que produziu a especificidade norte-americana – primeira economia a se planetarizar. O projeto original era tratar exaustivamente o fenômeno norte-americano, visando a contribuir para que nos países latino-americanos se criem institutos de pesquisas e cursos universitários dedicados a seu estudo. As circunstâncias, conforme se verá, levaram-me a modificar esse projeto e antecipar o meu traslado para a Europa. Contudo, considerei conveniente incluir no texto o essencial do material preparado no quadro dessa pesquisa.

Na segunda metade de 1965 inicio minhas atividades universitárias em Paris. A energia com que de Gaulle acabava de liquidar os restos do colonialismo francês e enfrentava o hegemonismo norte-americano abrira à França um espaço na arena internacional que ela se apressava em ocupar. Paris se transformara no polo de atração de todos os movimentos de liberação ou de contestação da vasta e heterogênea área que começava a ser referida como Terceiro Mundo. Sem lugar à dúvida, vivíamos um desses períodos excepcionais da História em que as utopias desempenham um papel de relevo no desenho do destino dos povos. Uma mensagem política emitida em Paris, nessa época, obtinha facilmente grande repercussão. Os livros aí publicados eram rapidamente difundidos em vastas áreas do mundo. Logo percebi que era importante repensar as estruturas de poder em sua nova configuração mundial e escapar aos chavões das doutrinas recebidas do século XIX; mas não menos urgente era fazer com que as ideias renovadoras se difundissem eficazmente. Com o passar do tempo, dera-me conta de que a fraqueza maior do Terceiro Mundo estava no plano das ideias: éramos colonizados mentalmente, por um lado, e por outro permanecíamos prisioneiros de velhas doutrinas “revolucionárias” que haviam passado de moda nos centros metropolitanos. A esses anos de febril atividade intelectual e de buscas de novas pistas refere-se a Parte III, anos em que se agudiza no Brasil a reação contra o pensamento crítico independente. Também estão aí reunidas observações que tive oportunidade de fazer em países que lutavam para liberar-se dos grilhões do subdesenvolvimento, e o registro de minha participação em debates ocorridos na época em que foi maior a esperança de reconstrução da ordem econômica mundial. Esses textos estão datados quando reproduzidos em sua forma original.

As lutas sociais do século XX são caudatárias de ideologias concebidas nos dois séculos anteriores, particularmente no XIX. Em torno desse tema elaborei um ensaio que se destinava a fundamentar uma investigação sobre as experiências contemporâneas de reconstrução voluntarista das estruturas sociais. Esse ensaio teórico abre a Parte IV, dedicado ao que chamei de “experiências de engenharia social”. As observações que fiz em alguns países que se empenhavam em reconstruir suas estruturas sociais são apresentadas na forma original, com as datas respectivas. Por todas as partes, pude comprovar que a um período inicial de entusiasmo seguia-se a frouxidão, e mesmo a esclerose, sendo mínima a participação da cidadania na gestão da coisa pública e no controle dos que exercem o poder.

Minha longa vivência das atribulações dos países que ficaram presos na armadilha do subdesenvolvimento levou-me à convicção de que o esforço requerido para daí escapar é de tal monta, que somente a formação de um amplo consenso nacional poderá fazê-lo viável. Ora, um consenso dessa ordem dificilmente pode emergir e perdurar em uma sociedade altamente estratificada e na qual os grupos dominantes possuem poderosos aliados externos. Por outro lado, a imposição a imposição de mudanças estruturais por uma minoria, qualquer que seja sua orientação ideológica, tende a engendrar uma burocratização das engrenagens do sistema de poder de difícil reversibilidade. Os casos em que circunstâncias externas forçaram e tornaram possível a modernização das estruturas sociais são exceções que confirmam a regra.

Somente uma sociedade aberta – democrática e pluralista – é apta para um verdadeiro desenvolvimento social. Mas como desconhecer que nos países do Terceiro Mundo – dadas as condições atuais de entrosamento internacional dos sistemas produtivos e dos circuitos financeiros – as estruturas de privilégios praticamente são irremovíveis? Empiricamente se comprova que nos países ricos a sociedade é cada vez mais homogênea, no que respeita às condições básicas de vida, e no mundo subdesenvolvido ela é cada vez mais heterogênea. Não surpreende, portanto, que esta época de grande enriquecimento da humanidade seja também de agravação da miséria de uma ampla maioria.

O avanço político, que é o mais difícil e importante de todos que logra o homem, faz-se aprendendo a administrar conflitos. Daí que só as sociedades democráticas o realizem com segurança. Trata-se de manter a sociedade aberta, num mundo de crescente interdependência, preservando e exercendo a capacidade de autogoverno. É um problema com mais incógnitas do que equações. Mas será que existe solução para todos os problemas que envolvem o destino dos homens?

Paris, dezembro de 1990

sábado, 31 de dezembro de 2011

NASCIMENTO DE UMA NOVA HISTÓRIA PARA O BRASIL

NEUZA MACHADO


NASCIMENTO DE UMA NOVA HISTÓRIA PARA O BRASIL

NEUZA MACHADO


Jamais Se Viu Isso Antes
No Velho Gran Brasil Senil:
O Presidente “Nunca Dantes”,
O Luís dos Votos-Mil,

Em Governar Actuante,
Distinguido, Mui Gentil,
Acabando Co’a Inflamante
Vei-Miséria do Brasil...

Já Dizia o Gran Foucault,
Em Seu “Poder e Verdade”,
Que o Vei-Contar Camuflou
A Forma-Realidade...

A Constituição do Saber,
Do Domínio do Discurso,
Não Precisa Acontecer
Só Em Sujeito Robusto...

A História Não Precisa
Só Buscar o Gran Jaião
O Saber Não Prioriza
Nenhum Rico de Mansão...

A História Deve Ser Pleito
De Um Exame Sem-Igual,
Constituir o Sujeito
A Partir da Trama Geral...

Genealogia é Isto,
Segundo o Grande Foucault:
Um Historiar Nunca Visto
Nas Aras do “Já Passou”...

A História Tem de Dar Conta
Da Constituição do Saber...
Dos Discursos de Pilantras...
Dos Jaiões do Mau-Viver...

Não Será Preciso Dizer
Se o Sujeito é Transcendente,
E Muito Menos Compreender
O Seu Estar Imanente...

Seja Ele Um Transcendente
No Campo do Acontecer,
Ou de Identidade Demente
Ao Longo de Seu Viver,

A História Acontecida
Não Precisa Valorar...
Em Boa História de Vida,
A Origem Deve Exaltar,

Seja Pobre, Seja Rico,
Uma História Exemplar...
Em Bailão ou Bailarico
Constitui-se o Historiar...

Nas Histórias do Passado
Dos Jaiões do Gran Brasil,
Só Se Viu Papo-Enfunado
Replecto de Gás Senil...

Era Só Papo e Mais Nada,
Discurso de Papa-Ovo...
Identidade Despejada
A Enganar o Pobre Povo...

Os Dictos do Gran Francês,
A Que Narra Entende Agora,
Por Isto, na História da Vez,
É o Bom Luís Que Vigora...

Transcendente ou Imanente,
O Luís é o Grande Irmão,
Um Grande Irmão!, Diferente
Dos Irmãos-Jaiões de Então...

Nasceu Pobre, o Nosso Irmão,
Em Um País-Terceiro Mundo:
No Brasil... Do Pobretão
Que Sofria Um Mal Profundo...

O Mal de Quem Não Tinha
Sonho Para Sonhar...
Na Mesa... Pouca Farinha
Para a Fome Enganar...

Só Pra Você Se Lembrar
Do Vei-Passado Anormal:
Ao Rico... Um Bom Caviar
Ao Pobre... Pouquinho Sal...

Que o Governo do Luís
Fique na História Civil
Quomo Um Governo Que Quis
Somente o Bem do Brasil.