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sábado, 6 de abril de 2013

A HISTÓRIA DE ANTÔNIO: MEUS DOIS IRMÃOS RESERVISTAS NA REVOLUÇÃO DE TRINTA E DOIS


A HISTÓRIA DE ANTÔNIO: MEUS DOIS IRMÃOS RESERVISTAS NA REVOLUÇÃO DE TRINTA E DOIS


ANTÔNIO DE SOUSA COSTA

 


 

Na época desse caso que vou contar, eu já estava com vinte e dois anos de idade, tendo eu dois irmãos, reservistas, o Álvaro e o Eurico, os quais foram intimados para comparecerem e fazer parte do Comando Revolucionário, na revolução de trinta e dois, no governo de Getúlio Vargas.

 

As estradas da Zona da Mata, em Minas Gerais, naquela época, eram péssimas, mas, mesmo assim, os caminhões do exército rodavam com aquelas bandeiras vermelhas, agitadas com o vento, e os homens fardados gritando feitos loucos.

 

E eles desceram do caminhão, e chegaram até a casa de meu pai, e perguntaram pelo Álvaro e pelo o Eurico. Meu pai disse: “– O Álvaro já é casado, é senhor de si. O Eurico, eu posso mandar. Qual o dia?” Eles disseram: “– Amanhã, manda ele até Carangola, para que ele se apresente ao Comandante das Forças Revolucionárias”.

 

Eurico iria servir no 10o Batalhão, em Juiz de Fora, pois o dito 10o Batalhão fora convocado para manter a paz em Paraíba do Norte, na ocasião em que o Governador João Pessoa foi assassinado. O 10o Batalhão de Infantaria, no qual o Eurico iria servir, não chegou na Paraíba, mas, foi até Montes Claros, que fica na divisa de Minas Gerais com a Paraíba. Em Montes Claros, os soldados ficaram acampados, esperando ordens para atacar os revoltosos, mas, quando os revoltosos souberam que o 10o Regimento de Infantaria de Juiz de Fora estava pronto para atacar a Cidade, e que estava também perto, em Montes Claros, a Revolução terminou. E, assim, o 10o Batalhão de Infantaria de Juiz de Fora voltou, sem ser preciso dar nem um tiro.

 

Mas, no dia em que os tais homens foram à casa de meu pai, aquele grupo do caminhão ainda não havia tido notícia do término da Revolução. Assim, já que fora convocado, o Eurico não se intimidou. No outro dia, seguinte, ele preparou-se, despediu-se de todos nós, e seguiu até Carangola. Mas, também, com muita sorte, ao chegar em Carangola, soube que a revolução tinha terminado.

 

No dia em que meu pai havia sido intimado para mandar o Eurico ao Comando das Forças Revolucionárias, e intimado a procurar o Álvaro, para também incorporá-lo no Comando da Revolução, eu estava em casa do compadre Divino, juntamente com muitas outras pessoas que frequentavam a casa dele, para fazer cabelo ou, alguns, para barbear. Foi aí então que chegou a notícia, ali na sala do compadre Divino, que tinha uns homens, com um caminhão, convocando reservistas para a revolução. E disseram também que meus dois irmãos já estavam presos, para descerem até Carangola, e que, talvez, qualquer um entre os que ali estavam na casa do compadre, até quem não fosse reservista, estava sujeito a ser convocado para a luta.

 

Nesta dita hora, o compadre Divino de Souza lembrou-se da solapa de pedra da fazenda da mãe dele e disse pra mim: “– Compadre Antônio, você hoje não vai pra casa não! Vamos nos esconder lá no alto da pedra. Lá tem uma solapa bem grande, e nós vamos passar a noite lá, e ficamos até a guerra acabar”. Eu respondi ao meu cunhado e compadre: “– Eu não vou! Se os meus irmãos já estão presos, para irem combater, eu também vou”. Eles me imploraram, para que eu não voltasse para casa, mas, eu sempre dizendo: “– Se meus irmãos já estão prontos para irem combater, eu também vou”.

 

E, assim, eles viram que não adiantava nada insistirem comigo, mas, resolveram subir o morro. O compadre Divino tinha mais dois irmãos, que já estavam rapazinhos, mais ou menos dezoito a vinte anos, tinha também dois vizinhos com, mais ou menos, a mesma idade de seus irmãos, e reuniram-se, com mais alguns, e subiram o morro, carregando esteira de taboa e cobertores, até água eles levaram para o morro, bem no alto.

 

Para chegarem à solapa, eles teriam de passar pelo mato, que circundava o morro. Eu estava ainda em distância, e olhei para trás, e vi quando eles estavam subindo o morro. Era uma fila de uns oito a dez, mais ou menos. E, quando cheguei em casa, não era nada da notícia que tinha chegado lá em casa do compadre Divino. O Eurico estava debaixo de ordem, o Álvaro ainda não tinha aparecido, e os homens, os que estiveram lá, já tinham ido embora, deixando ordem com meu pai para mandar os dois no outro dia.

 

Mas, eu fiquei preocupado com o compadre Divino, que tinha ido se esconder naquele alto de serra, aonde tinha tanto perigo, como na guerra; além de ter onça e outros bichos perigosos, tinha também cobras venenosas, como jararacuçu, cascavel, e outros perigos, que podia haver contra eles.

 

E com esta preocupação, que fiquei, pensando neles, eu fui no outro dia até a casa do compadre Divino, para saber o que tinha acontecido. E já encontrei ele em casa, e, com muita graça, ele contava o que tinha acontecido. Dizia ele, que acamparam debaixo da pedra, e dormiram. Lá, tantas horas da noite, ele acordou, e esqueceu-se que estava debaixo de uma pedra, e, pensando que estava em casa, levantou, e bateu com a cabeça na pedra, quase desmaiando. Passou a mão na cabeça, e notou que tinha um caroço no alto da cabeça, que, lá em Minas Gerais, eles chamam isto de “um galo”. E, nisso, ele acordou os outros companheiros e disse: “– Vamos embora para casa! Agente, pra morrer, não é preciso ir para a guerra, pois eu quase morri, aqui mesmo”. E desceram o morro, ainda com noite. Ele contava isto até com muita graça.

 

Compadre Divino de Souza era muito brincalhão, pra ele não tinha tempo ruim. Comadre Malvina tinha uma cabra de leite, que dava dois litros de leite por dia. O leite era para a alimentação dos filhos, mas sempre sobrava leite e ela fazia café com leite. Enchia um bule bem grande de café com leite, punha em cima da mesa, e um prato cheio de bolo de fubá de milho. Compadre Divino, sempre naquela brincadeira, dizia pra mim: “– Não tem cerimonha!” E enquanto tivesse café com leite no bule e bolo no prato, ele dizia: “– Não é pra sobrar nada!” E sempre sorrindo.

 

Mas não teve a felicidade de viver ao lado da mulher amada por muitos anos. Comadre Malvina, minha irmã mais velha, faleceu aos quarenta e dois anos de idade, deixando o Compadre Divino com dez filhos, sendo que o filho mais velho já estava casado. O segundo filho já estava rapaz, e tinha uma menina moça e mais sete filhos menores. Ele se viu obrigado a tornar a se casar.

 

Bem perto de sua casa morava um senhor que era pai de muitos filhos, muito amigo do Compadre Divino, e vendo que a vida do Compadre era muito sacrificada, pois eram muitas crianças pra ele olhar sozinho, sem uma companheira. E os dois entraram em acordo. Compadre Divino casava com a filha mais velha, e o filho mais velho desse vizinho casava com a filha do Compadre Divino. E assim Compadre Divino casou a filha com o filho do vizinho, e o vizinho casou a filha com o Compadre Divino.


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