Quer se comunicar com a gente? Entre em contato pelo e-mail neumac@oi.com.br. E aproveite para visitar nossos outros blogs, "Neuza Machado 1", "Neuza Machado - Letras" e "Caffe com Litteratura".

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE: UM PRÉ-ANUNCIADOR? "E AGORA JOSÉ?"

CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE: UM PRÉ-ANUNCIADOR?
“E AGORA, JOSÉ?”

NEUZA MACHADO





Este sempre atualíssimo poema de Carlos Drummond de Andrade, nesses nossos dias de crise monetária mundial, e em relação aos desmoronamentos sócio-políticos que estão a abalar os alicerces das abastadas e presunçosas elites, e levando ao sofrimento e à fome a maior parte da humanidade, poderá ser lido e interpretado com uma certa liberdade pelo leitor consciente. Os leitores-eleitos descobrirão que umas poucas elevadas cabeças – do Brasil e do Mundo –, ricamente orgulhosas de suas posses e poder, irão encaixar-se perfeitamente na “carapuça poético-reflexiva” de nosso genial escritor (uma vez que os verdadeiramente deserdados da sorte monetária estão, neste momento, a léguas de distância das leituras reflexivas).


Carlos Drummond de Andrade publicou este seu poema em meados do século XX (quando o mundo passava pela terrível Segunda Guerra Mundial, quando o Brasil se debatia nas garras violentas da miséria extrema – da maioria de sua população). Naquele momento, éramos todos – nós os brasileiros da segunda metade do século XX – o tristonho “José” desse poema.


E para que o poema de Carlos Drummond de Andrade continue neste século XXI a “incomodar” reflexivamente os atuais leitores brasileiros (principalmente, aqueles que ainda não leram a criação poética do referido escritor), eu o postarei hoje, com muito prazer, certa de que os Internautas-Leitores que me honram com suas visitas a este meu Blog em especial saberão entender as mensagens que subjazem em suas entrelinhas.


Apreciem também, além da imprescindível leitura reflexiva, o poema “José”, de C. D. de Andrade, musicado e cantado por Paulo Diniz (singularíssimo cantor brasileiro atualmente pouco divulgado pela mídia partidária e elitista).


JOSÉ

Carlos Drummond de Andrade

E agora, José?

A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José?
e agora, você?
você que é sem nome,
que zomba dos outros,
você que faz versos,
que ama, protesta?
e agora, José?

Está sem mulher,
está sem discurso,
está sem carinho,
já não pode beber,
já não pode fumar,
cuspir já não pode,
a noite esfriou,
o dia não veio,
o bonde não veio,
o riso não veio
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, José?

E agora, José?
Sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio – e agora?

Com a chave na mão
quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas não há mais.
José, e agora?

Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse
a valsa vienense,
se você dormisse,
se você cansasse,
se você morresse...
Mas você não morre,
você é duro, José!

Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja a galope,
você marcha, José!
José, para onde?


Nenhum comentário:

Postar um comentário