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segunda-feira, 4 de março de 2013

A HISTÓRIA DE ANTÔNIO: O CARRO DE BOIS DE MEU PAI ZECA DE SOUZA


A HISTÓRIA DE ANTÔNIO: O CARRO DE BOIS DE MEU PAI ZECA DE SOUZA


ANTÔNIO DE SOUSA COSTA
 

 


 


Meu pai Zeca de Sousa tinha carro de bois, mas não era carreiro. Quem trabalhava como carreiro era Antônio Pedro de Oliveira, casado com uma irmã de minha mãe, a minha tia Corina. Antônio tinha o apelido de Carabineiro, Antônio Carabineiro, mas, não era um bom carreiro, porque batia nos bois inconscientemente, não tinha noção do que estava fazendo. O boi que não merecia apanhar, nesse é que ele batia mais e com mais força. Sendo eu o candeeiro que guiava os bois, observava o quanto ele maltratava os nossos bois. Eu sempre avisava a meu pai, mas ele não acreditava em mim. Pensava que eu dizia aquilo por despeito, porque eu reclamava com meu pai que o Antônio Carabineiro me humilhava perto de outras pessoas. Ele me maltratava com gritos, mas era só quando chegava perto de outros carreiros, dando ferroada naqueles bois que não gostavam de apanhar, e dava berros e berros, e tinha outros defeitos mais. Eu, vendo aquilo tudo de errado, não era autorizado a falar nada.

 

Mas, um dia, meu pai viu com seus próprios olhos. Meu pai tinha feito uma mudança de residência provisória. Deixou a nossa casa, com um dos irmãos tomando conta, e mudou-se para a Fazenda de Jove de Souza, aonde ele tocava uma lavoura de café à meia com o fazendeiro. Nós tínhamos também lavoura de café, mas era pequena. Como meu pai já tinha dois filhos já rapazes, e tinha também dois empregados, achou que era um bom negócio ter mais café para vender. E, assim, ele ficou morando provisoriamente em uma tulha da Fazenda de Jove de Souza. E o Carabineiro, em nossa propriedade, agia como se fosse o dono do carro.

 

Um dia, o Antônio Carabineiro e eu, que o ajudava como candeeiro dos bois, fomos buscar uma mudança em um lugar bem longe de nosso lugarejo. Tivemos de viajar três dias com o carro de bois de meu pai. Saímos do nosso Sítio e caminhamos até chegar aonde íamos apanhar a tal mudança. No outro dia, retornamos com o carro carregado e viemos até a Fazenda do Jove de Souza, onde meu pai estava morando provisoriamente. Soltamos os bois e permanecemos até o outro dia. De manhã cedo, nós pegamos os bois, para seguirmos até a entrega da mudança. Mas, meu pai deu-lhe uma ordem. Sendo o Antônio Carabineiro padrinho de uma das minhas irmãs, meu pai chamava ele de compadre, e disse pra ele: “– Compadre Antônio, quando chegar lá em casa, ocê solta os bois, que é pra eles descansar, beber água, depois, ocê pega os bois e vai fazer a entrega da mudança”. Nós nos despedimos e seguimos com o carro cantarolando, caminhando estrada a fora.

 

Mas, quando chegamos em nosso Sítio, o Antônio Carabineiro não obedeceu à ordem de meu pai e passou direto. Isto era meio-dia, com o sol quente. Os bois estavam acostumados a chegar ali e serem soltos, e já não queriam andar. Pouco à frente, tinha um morro para subir. No início do morro tinha uma mina de água que formava um atoleiro. Chegamos ao pé do morro e o carro atolou. Os bois já cansados, e por terem passado onde eles estavam acostumados a serem soltos, não quiseram puxar o carro. Carabineiro parecia até que estava louco. Começou a dar pregada nos bois, com a guiada, até ficarem, todos, ensanguentados. Depois começou a dar com o pé da guiada no focinho dos bois, até os bois caírem no chão. Era uma junta de bois de guia de muito valor, e ficaram com os focinhos esbagaçados.

 

Mas, por azar do Carabineiro, meu pai estava chegando e, quando o meu pai viu os bois todos quase mortos, e a junta de bois de guia deitada no chão, sem força nem para levantar, quase ficou louco. Meu pai maltratou ele com nome ruim, de toda espécie. Nesse momento, veio chegando um amigo do Carabineiro, e quis dar razão a ele. Mas, meu pai estava em estado perigoso e desafiou todos os dois, mas, nenhum resolveu nada contra meu pai. Então, meu pai disse ao Antônio Carabineiro, que era carreiro nosso já há vários anos: “– Larga meu carro e vai embora! Não quero ocê nem mais um dia pra ser meu carreiro!” O Carabineiro humilhou-se, e disse a meu pai: “– Eu vou ajudar a descarregar o carro. Depois de vazio, agente encosta ele ali no terreiro do Marcolino. Eu carrego a mudança e coloco dentro do carro e, depois, eu vou embora”. Meu pai aceitou.

 

Depois que descarregaram o carro, mesmo vazio, os bois não queriam subir o primeiro tope do morro. Mas conseguimos encostar o carro no terreiro de tio Marcolino. Depois, ele carregou a mudança nas costas, com a ajuda de mais alguns que ali chegaram. Encheu o carro novamente. E o Antônio Carabineiro foi embora. No outro dia, meu pai disse para mim, que já estava com quinze anos: "– De hoje em diante, meu filho, ocê é o meu carreiro!”

 

Assim, eu comecei a carrear para meu pai aos quinze anos de idade. Ainda não tinha força para carregar sessenta quilos, mas o meu pai acompanhava o carro e me ajudava carregar o carro. Carreei até os vinte e três anos, depois, deixei de carrear, para fazer outros serviços. Os dois bois de guia, com o passar do tempo, não prestavam mais pra serviço e foram emagrecendo até morrerem.

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